Pular para o conteúdo principal

ADAPTAÇÃO DO POEMA "VIVER", DE MINHA AUTORIA

Soneto "Viver"
(adaptação do poema “Viver”, de minha autoria)

Não tente entender,
Apenas tente sentir.
A vida é mesmo para viver
E não para entender.

Solte-se no leito do rio,
Solte-se no sopro do vento,
Solte as amarras da ilusão
E se deixe levar.

Apaziguado o vai e vem mental,
Aceite como fato as provas da vida
e deixe bailar o coração.

Refaça-se nas paradas e estações,
Supere os desencantos
Rendendo-se aos encantos.

Luciana G. Rugani

💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝💝

A meu pedido, o nobre amigo e professor de Literatura, Dante Gatto, fez a análise desse meu poema sob o foco clássico e sob seu próprio foco. Disse considerá-lo um lindo soneto pós-moderno. 
A análise do professor me trouxe alegria e foi o que me motivou a publicar o poema como meu primeiro soneto. Na verdade, esse poema foi composto no ano de 2010. Na época, eu o intitulei como "Soneto Viver" e fiz a divisão dos versos em estrofes de 4, 4, 3, 3. Entretanto, em 2019, quando da publicação de meu primeiro livro, um colega me alertou que, para ser considerado soneto, o poema deveria seguir as demais regras da métrica. Então decidi por refazê-lo. Mudei o título para "Viver", incluí mais alguns versos, alterei a composição das estrofes. E nunca mais fiz um soneto! Dias atrás, na 61ª edição da live Baralharte sobre o tema "Sobrevivência do soneto", o professor Dante explicou que o poema não deixa de ser soneto por descumprir as regras da métrica. E foi a sua fala que me motivou a reescrevê-lo e publicá-lo como meu primeiro soneto. 
Segue abaixo a análise completa do professor Dante Gatto:

"Pois sim, Luciana, discutimos longamente sobre a questão da forma soneto e da
sua origem e prerrogativas no universo clássico. Penso eu que não devemos ficar preso
ao passado, apesar da necessidade fundamental de conhece-lo e estuda-lo. Se assim
fizéssemos, ficar preso ao passado, então não teríamos poesia no modernismo e
deveríamos então descartar infinitos autores que não sabemos não amar como Mário de
Andrade, Oswald, Cabral, Murilo Mendes, Drummond, Quintana e muitos outros.
Reconhecemos os poetas, reconhecemos as escolas literária em que eles atuaram e
trouxemos a contribuição deles para o nosso tempo, ampliando as perspectivas. Só para
dizer de um aspecto, o verso livre, que substituiu o verso regular antes praticado, requer
também trabalho artístico, senão caímos numa situação prosaica que é tudo o que não
queremos.
Eu vou fazer uma breve análise formal do teu soneto, a partir dos paradigmas
clássicos com uma única intenção: verificar a suas inovações.
Não/ ten/te en/ten/der,/ ER 5 (2/5)
A/pe/nas/ ten/te/ sen/tir./ ER 7 (2/4/7)
A/ vi/da é/ mes/mo/ pa/ra/ vi/ver/ ER 9 (2/6/9)
E/ não/ pa/ra en/ten/der./ ER 6 (2/6)
Veja que você combinou em um quarteto versos com esquemas ritmos diversos.
Fez uso das rimas, também, de uma maneira pouco usual. O esquema é ABAA. Ficou
bom. Um clássico jamais faria isto. Mas nós podemos. O que importa é o efeito estético.
A ideia deste quarteto circula em torno de três verbos de ação: viver, entender e
sentir. E você aconselha ao seu interlocutor poético a ação de sentir para viver.
Veja outro recurso sonoro que você utilizou nesta estrofe. Geralmente fazemos
isto espontaneamente. Veja que no primeiro, segundo e quarto verso há a presença
ostensiva do “t” e do “d”. Oclusivas. Batem forte, não é? Mas no terceiro verso, que traz
a ideia nuclear, você insere a presença mais evidente do “m” e do “v”, cujos som é mais
espraiado e dá mais leveza. A sonoridade, portanto, combina-se com a ideia.
Sol/te/-se/ no/ lei/to/ do/ ri/o, ER 8 (5/8)
Sol/te/-se/ no/ so/pro/ do/ ven/to, ER 8 (5/8)
Sol/te as/ a/ma/rras/ da i/lu/são/ ER 8 (4/8)
E/ se/ dei/xe/ le/var./ ER 6 (3/6)
Sem dúvida, esta estrofe está melhor construída, apesar da ausência de rimas.
Veja que o último verso com seis sílabas poéticas contrastando com os três primeiros
deu um destaque interessante. Soma-se a isto o paralelismo do primeiro com o segundo
verso já sofrer uma quebra com a estrutura do terceiro verso, mesmo com a repetição do
verbo soltar. Essa repetição tem o nome de anáfora e é muito produtiva para amarrar
uma ideia. Nos dois versos paralelos, o primeiro e o segundo, o eu-lírico aconselha a
liberdade a partir da conciliação com a natureza, mas no terceiro verso, o não paralelo,
há o conselho em outro sentido, interior, pessoal. Veja ainda que o primeiro e segundo
verso a presença do “o” cria uma sonoridade mais austera que vai ser diluída no quarto
verso com a presença massiva do “e”, mais suave. Genial.
A/pa/zi/gua/do o/ vai e/ vem/ men/tal, ER 8 (4/8)
A/cei/te/ co/mo/ fa/to as/ pro/vas/ da/ vi/da ER 11 (2/6/11)
E/ dei/xe/ bai/lar/ o/ co/ra/ção/. ER 9 (2/5/9)
Acho que está estrofe ficou comprometida sonoramente por conta do segundo
verso maior que os outros e que traz uma ideia mais racionalizada. Aqui também não há
rimas. Há uma sugestão para a meditação, não é? Na primeira estrofe, o conselho; na
segunda estrofe, a receita e nessa terceira estrofe o afunilamento para o coração. Isto
implica pessoalizar o sentir.
Caiu muito bem, no último verso, a prosopopeia “bailar o coração”. Isto induz a
pensar que os sentimentos não estavam num estado de completude, considerando que a
natureza do ser está no sentir.
Re/fa/ça-/se/ nas/ pa/ra/das/ e es/ta/ções, ER 11 (2/7/11)
Su/pe/re os/ de/sen/can/tos ER 6 (2/6)
Ren/den/do-/se aos/ en/can/tos. ER 6 (2/6)
Aqui você compara o viver a uma viagem de trem com as estações e paradas, e
retoma o conselho inicial com a antítese desencantos / encantos. Fica claro que se se
pensar terá desencantos, mas se sentir terá encantos. Então, há um fechamento da ideia
inicial, da primeira estrofe, e a ênfase ao sentir. É aquilo, se você pensa acaba criando
ilusões e você sugere um postura de apenas sentir, hedonista, que cai bem com a pós-
modernidade.
Bem, achei lindo o poema. Um soneto pós-moderno.
Vamos conversando.
Dante Gatto, 08 de maio de 2024".

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

4ª EDIÇÃO DO BARALHARTE - DISCUSSÃO DE TEMAIS DA ATUALIDADE

Ontem, sábado, aconteceu a 4ª edição do BARALHARTE!  Trata-se de um encontro de debatedores sobre quatro temas atuais, representados pelos quatro naipes do baralho e por quatro regiões diferentes de nosso país. Cada debatedor leva um tema que será debatido pelos demais e também por convidados presentes. Os debatedores desta edição foram eu, Luciana, representando o estado do Rio de Janeiro, Gilvaldo Quinzeiro, representando o Maranhão e Amaro Poeta, representando Pernambuco. Fernanda Analu, representando Santa Catarina, em razão de um compromisso de última hora, não pôde participar. Mas contamos também com as convidadas Mirtzi Lima Ribeiro e Valéria Kataki e com os convidados Hairon Herbert, Julimar Silva, Ricardo Vianna Hoffmann e Tarciso Martins. Agradeço a Gilvaldo Quinzeiro pelo convite e pela oportunidade de participar de um encontro tão engrandecedor, oportunidade que temos para aprender muito sobre variados assuntos. Cliquem abaixo para assistir: Luciana G. Rugani

1º SARAU CULTURAL EM CASA - EM PROL DOS ARTISTAS DE CABO FRIO

por Luciana G. Rugani - venho convidar todos para a 1ª edição deste Sarau Cultural em prol dos artistas de Cabo Frio, organizado por nosso amigo da dança, Allan Lobato. E u fui convidada e terei o maior prazer em participar! E, considerando que faço arte, mas tenho meu emprego formal para sobrevivência, e considerando também os tempos difíceis que estamos vivendo, comunico desde já que abro mão da minha parte do couvert para os amigos que vivem somente da arte.  Seguem abaixo todas as informações. Não percam!! Dia 06 de junho (sábado) a partir das 19h. Instagram: @Allan.lobato.5 Olha esse evento gigante pra vocês! Arte e cultura de Cabo Frio em casa! Poesia, música, dança, teatro e muito mais, com grandes artistas de nossa cidade numa live cheia de emoção, alegria e encanto. - Allan Lobato; - José Facury Heluy; - Edgard Moreira; - Ballet Gabi Vaz; - Rodrigo Leo; - Arte No Harém; - Teatro de bonecos do Clarencio Rodrigues; - Rodrigo Sena; - Gabriela Oliveira (Gaby) - Sebo do Jidduks;

POESIA PARA DUAS IRMÃS

Duas irmãs, Dois corações, Duas almas que trilham o mesmo caminho: de amor, fé e união. Impossível tratar aqui só de uma delas, Suas histórias se completam. Nos olhos de uma vejo a alegria que se estampa no sorriso da outra, No abraço de uma sinto o acolhimento que se estende à presença da outra. Duas almas plenas de sensibilidade, Que sabem amar e viver com alegria, Que sabem cultivar a luz nos seus dias, E, ainda que chegue a noite, Será sempre iluminada pelas estrelas. Porque a escuridão nada é, Perante a força que emana dessa união. Luciana G. Rugani