Hoje, no Blog do Totonho, falo sobre algo muito comum em nossa sociedade, que é a existência de "panelinhas", e de como isso acaba resultando em uma sociedade pouco democrática:
"Em nossa sociedade, infelizmente, grande parte das pessoas não são democratas na essência. A partir do momento em que se vive em tribos e, para nelas ser inserido, você precisa se abster de suas ideias, precisa se calar, se omitir, não pode se posicionar contra ou a favor de algo, então não há aí seres essencialmente democratas" - Gabriel Sousa Marques de Azevedo, presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte - CMBH, entrevista do dia 12/9/23, no Youtube da Rádio 98 FM.
A frase acima foi dita pelo vereador mineiro quando ele falava, em entrevista, sobre certos conflitos gerados por dissensões em grupos políticos, porém sua fala me fez refletir no quanto o seu conteúdo é bem mais frequente do que imaginamos, não somente no âmbito político, mas também nos mais variados setores sociais, e em como isso acaba gerando uma caraterística social.
Nunca fui adepta das tais "panelinhas", aqueles grupos fechados, em que geralmente se ouve apenas o que se quer e se fala apenas o que o outro deseja ouvir. Sempre preferi ter minhas próprias ideias e, ao atuar conjuntamente, ter ali o objetivo comum em meio à diversidade de cada um, com respeito e entrosamento e, em certos casos, até mais que isso, com afeto e com acolhimento, aquele acolhimento simbolizado pelo abraço.
Percebo que, nesses grupos fechados, costuma predominar uma falsa polidez, com agrados muitas vezes insinceros e pouca disposição para algo, de fato, coletivo. Vejo-os muito mais como um meio de promoção pessoal do que união de forças. Quando participamos de algo coletivo, é natural que haja pessoas com diferentes pensamentos e modo de ser, e as diferenças jamais são motivo para isolamento de uns e preferência de outros, pois são algo intrínseco ao coletivo. Creio que as tais "panelas" são fruto de algo que não chegou a amadurecer nas pessoas que a compõem. O espírito tribal seria uma forma de gerar sensação de segurança naqueles que ainda não percebem a própria insegurança, ou preferem protegê-la ao invés de vencê-la, pois, nas ditas "panelas", estão protegidas de questionamentos, de opiniões diversas e também de situações existentes apenas em suas próprias mentes. Uma pessoa imatura, participante de um coletivo diverso, sente-se ameaçada quando questionada em público, antecipa julgamentos inexistentes e melindra-se com facilidade. Não consegue lidar com o diverso, imagina que todos os olhares serão para si e presume que pensarão isso ou aquilo e, na maioria das vezes, isso tudo não passa de insegurança pessoal e pura imaginação. Uma simples pergunta feita em público já faz com que ela se sinta julgada, quando, na verdade, não é nada disso, trata-se apenas de alguém esperando uma resposta que esclareça sua dúvida. Mas a imaturidade grita mais alto, ela pega para si como se fosse uma ofensa, preconceitua aquela pessoa que perguntou e coloca-se em posição defensiva, como se ameaçada estivesse. O imaturo, então, fecha-se em torno apenas daquelas pessoas que, ainda que não concordem com algo ou que tenham visão diferente, optam por camuflar suas diferenças com sorrisos rasos de concordância.
Percebo muito isso em nossa sociedade, nos mais variados setores. Quando partimos de circunstâncias micro para circunstâncias macro, vemos que isso acaba resultando em uma sociedade pouco democrática, onde o debate e o esclarecimento são temidos; uma sociedade em que o outro é sempre uma ameaça e onde o olhar para si mesmo, o autoanalisar-se corajosamente para perceber onde é preciso amadurecer é ignorado. Opta-se pela reatividade e pelo fechamento em "bolhas de proteção", a essência primária das "panelinhas".
Creio que quanto menos avançada é uma sociedade, mais presente é esse espírito tribal. Quanto mais avançada a sociedade, maior a presença de seres livres, capazes de conviver harmonicamente com os outros e suas diferenças. O espírito tribal é próprio de sociedades mais infantilizadas. Não é o livre pensador democrata que deve regredir aos tribais, mas sim os tribais que precisam avançar e se libertar.
Luciana G. Rugani
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