"Qual o preço de sua coerência"? Essa frase cabe muito bem na atualidade, principalmente em ano eleitoral.
Segue meu mais recente artigo do Blog do Totonho, publicado na última quinta-feira:
Sei que não deveria mais, mas é verdade: eu ainda me assombro. Ainda me assombro com certos absurdos. Ainda me assombro e me pergunto: “como pode?” quando percebo, por exemplo, a presença da desfaçatez; quando sei que escuto uma inverdade; quando vejo raposas cuidando de galinheiros; ou ainda quando a coerência cede lugar ao oportunismo. Hoje em dia, são muitos os motivos que podem nos causar assombro, pois vivemos em uma sociedade, em grande parte, adoecida. Há aqueles que acusam a outros e que, quando menos se espera, agem da mesma maneira e causam os mesmos danos que aqueles a quem acusavam; há aqueles que querem paz, porém semeiam guerra; outros querem proteção de seus direitos, mas passam por cima dos direitos alheios. Daí nos assombramos, pois a incoerência se faz gritante! São muitos “saltos” de um extremo ao outro, muita fachada de virtude e pouco conteúdo real. Quantos cidadãos desejam uma Saúde, ou uma Educação, de qualidade, porém são os primeiros a apoiar candidatos que utilizam esquemas de mau uso de verba pública. Por serem comuns esses esquemas, esses cidadãos os têm como “normais”, e acabam reforçando e tornando crônica a triste realidade da pobreza em razão de mau uso de dinheiro público. Quantos repudiam um ou outro administrador, ou um ou outro direcionamento, porém, ao primeiro aceno de ganho pessoal, passam a tecer elogios e a firmar parcerias. Quanta incoerência percebemos em cada esquina! Como diz a linguagem popular, quanta incoerência “na cara dura”! E assim vamos vivendo, de assombro em assombro, não por serem fatos novos, ou por desconhecê-los, mas sim por perceber até que ponto caminha a incoerência e perguntar também: “qual o preço de sua coerência”? Certa vez, conheci alguém que dizia que, no seu entender, “todos têm um preço”. Eu, contudo, prefiro dizer que tudo tem um preço. Não “todos”, mas sim “tudo” e considero “preço” como sendo o esforço para se chegar a algum ponto. Sendo assim, o preço de caminhar mais leve, sem semear a destruição por meio das atitudes, sem cultivar a hipocrisia e sem reforçar o mau caratismo que se faz presente é, muitas vezes, abrir mão dos atalhos de facilidades que surgem no meio do caminho e utilizar recursos legítimos para prosseguir. Da mesma forma, o preço que se paga ao fazer uso dos tais atalhos é, muitas vezes, abrir mão de ser quem se é, afastar-se cada vez mais daquela paz tão almejada e seguir a vida com a permanente sombra da consciência a gritar no vazio do ser. Todas as nossas ações geram reações, e toda decisão que tomamos envolve um custo, seja esse custo material ou imaterial. Por isso não considero que as pessoas têm preços, mas sim que as atitudes que tomam possuem um custo que elas estarão ou não dispostas a pagar. Cometer o mesmo erro que muitos cometem, com a justificativa de ser algo comum, é consolidar panoramas que precisam mudar, é reforçar condutas que levam a carências cuja provisão amanhã estaremos novamente pleiteando, é fortalecer a causa da qual amanhã sofreremos os efeitos.
Enfim, esse é um tema amplo, que comporta muitos debates. Somente no fim do dia tive a certeza de que teria que sentar e escrever algo sobre isso. Acordei hoje cedo apenas com a frase: “qual o preço de sua coerência?”. Sabia que tinha algo a falar sobre isso, entretanto não conseguia organizar o conteúdo. À tarde, pensei: “farei um poema intitulado ‘Assombros”. Mais uma vez, parei por aí. Por fim, há pouco, no início da noite, li uma notícia que me fez questionar: “como pode?”. Aí sim, as ideias se organizaram e o texto surgiu. Talvez uma previsão inconsciente de que, pra variar, mais uma notícia absurda, daquelas que chamam a atenção pelas conexões envolvidas, surgiria no fim do dia.
P.S.: um dia ainda farei um poema sobre isso, intitulado “Assombros”.
Luciana G. Rugani
Academia de Letras e Artes de Cabo Frio – ALACAF e Academia de Letras de São Pedro da Aldeia – ALSPA.
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